Traduttore traditore

Um Povo Resignado e Dois Partidos sem Ideias

Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta.
Abílio de Guerra Junqueiro

Isto não sucedeu só na tradução mas foi a tradução que a vigarice de Estado mais violentamente afectou. O AO90, ou seja, a imposição canina da língua brasileira, não apenas implicou a falência, a ruína, a extinção da actividade de tradução em Portugal, de empresas e principalmente de tradutores por conta própria, como implicou a pura e simples extinção do próprio conceito de “Língua Portuguesa”: o chamado “Português europeu” foi administrativamente abolido e em seu lugar aparece agora por todo o lado o brasileiro, essa horripilante “língua universáu”. A própria bandeira portuguesa foi virtualmente arreada e içada em seu lugar a bandeira brasileira para significar “Portuguese” nas empresas de tradução internacionais.

Claro que a geral carneirada, os burros de carga de que falava Guerra Junqueiro em 1896, engoliu esta imperdoável afronta e lá seguiu, com um encolher de ombros e assobiando, num alegre optimismo que faria inveja a qualquer Miguel de Vasconcelos temporão e fantasmagórico.

De certa forma, com muito boa vontade e não menor caridade, a atitude da dita carneirada compreende-se; é do conhecimento comum que a hombridade e a coragem são, nos sinistros tempos que vão correndo, luxos caríssimos; a noção de honra, somente a noção. já sem ir mais longe, como o brio patriótico ou o orgulho nacional, não passam agora de vagas memórias que se misturam num passado longínquo com os nossos “egrégios avós”, que do hino se papagueia sem o mínimo significado.

Para esta nação de “heróis do mar” a terraplanagem neo-colonialista parece afinal ser indiferente, coisa de somenos. Para os tradutores em particular, de facto, sem ofensa (ou com ela, tanto se me dá), resta o labéu cujo significado, profundo e triste, só agora se revela e que pouco ou nada tem a ver com o do jogo de palavras antigo: tradução, traição.

[este jornal é português, não é brasileiro]

jornaldocentro.pt, 21.12.20

Qual é o custo de uma tradução online?

O cálculo do preço para traduções profissionais depende de vários fatores e varia de profissional para profissional e de agência para agência de tradução. Isto porque existem vários métodos diferentes para chegar ao valor final e também existem muitos fatores que influenciam a complexidade dos trabalhos.

Veja alguns exemplos do que pode influenciar o custo de uma tradução online:

Formato do documento: se o documento a ser reproduzido é muito complexo, o custo pode ser maior do que uma tradução mais simples. Por exemplo, se o documento a ser traduzido contém gráficos ou imagens que exigem tradução, o trabalho será maior e o custo da tradução também será maior; há também o DTP (Desktop Publishing), que influencia no custo da tradução online. Criar novos gráficos, tabelas ou imagens vai gerar trabalho extra.

O volume: um maior número de palavras ou de páginas tem um preço correspondente;

Prazo: traduções mais urgentes costumam ter um custo mais elevado;

Combinação linguística: quanto mais raro o idioma, maior será o preço da tradução.

Grau de conteúdo técnico: quanto mais técnicos forem os documentos, maior o preço;

Entre outros;

Quais são os cálculos de custo de tradução online mais comuns?

Pode aceder este site para saber mais sobre o Custo de Tradução https://www.protranslate.net/pt/custo-de-traducao/. De qualquer forma, os cálculos de custo de tradução online mais comuns são:

Custo de Tradução por Palavra

Nestes casos, o orçamento será de acordo com o número de palavras num documento. Este é um método de valorização bastante usado em empresas de confiança como a Protranslate, que possui uma plataforma online onde pode submeter o seu documento, selecionar um idioma e depois calcular o custo do serviço de tradução.

Custo por Página de Tradução Certificada

Como a modalidade de Tradução Certificada possui preços tabelados, os valores destes serviços costumam ser fixos. De qualquer forma, plataformas como a Protranslate também permitem que envie os seus documentos e tenha acesso a traduções profissionais de acordo com o serviço que necessita.

Tudo o que precisa fazer é aceder à plataforma, enviar o documento, selecionar o idioma de origem e o de destino que pretende na sua tradução. Depois, ser-lhe-á pedido que escolha a categoria da tradução, ou seja tradução certificada. A partir daí vai conseguir aceder a um valor médio do custo pelo serviço.

É importante salientar que, mais do que o custo, é preciso observar a qualidade da agência de tradução ou dos profissionais que farão o trabalho. Procure sempre empresas que também disponibilizem profissionais de revisão de texto, para garantir qualidade e legibilidade em cada documento, evitando erros de ortografia, gramática e estilo.

[A imagem de topo foi copiada do “site” LawLinguistics. O autor da pintura original (Torre de Babel) foi Pieter Bruegel the Elder (1563)]

Do “inconseguimento” e outros neologismos estranhos

publico.pt, 17.12.20

Louvor e explicação da “língua desportuguesa” de Ondjaki

Nuno Pacheco

Numa entrevista a propósito do seu mais recente livro, o escritor angolano Ondjaki disse a Isabel Coutinho (Ípsilon, 11/12) que o facto de o livro não trazer glossário se devia a estar escrito em “língua desportuguesa”, “a língua de liberdade estética”, explicando-se depois assim: “Não creio que deva haver uma língua desportuguesa nos dicionários para ensinar às crianças, não é disso que falo, não é aí que eu opero. Eu não opero com língua de dicionário, eu opero com língua de barro.” E dava como exemplos de “línguas desportuguesas” os brasileiros Manoel de Barros e Guimarães Rosa, os moçambicanos Mia Couto e Luís Bernardo Honwana, os angolanos Luandino Vieira e Manuel Rui e o guineense Abdulai Silla.

Logo no título, Ondjaki parece dizer ao que vem: O Livro do Deslembramento, como que cruzando a sonoridade de “deslumbramento” com o acto de esquecer. Mas para quem julgue que se trata de neologismo, convém dizer que deslembrado, deslembrança, deslembrar ou até mesmo deslembrativo já constam dos dicionários, justificando plenamente deslembramento. Tal como consta o desnascer usado por José Mário Branco no FMI ou há-de constar um dia o desconseguir que Mia Couto popularizou na escrita, mas foi buscar à oralidade quotidiana.

A “língua desportuguesa”, na acepção que lhe é dada por Ondjaki, é praticada há décadas, senão mesmo há séculos. Porque tem sido a liberdade estética, aliada às tradições e também às inovações culturais, a alimentar os dicionários e não o contrário; é o barro da escrita, moldado a partir do barro (esse ainda mais indomável) da fala, que vai aos poucos enriquecendo os volumes que registam a evolução da língua na sua forma oral (pela fonética) e escrita. Que isso se deva sobretudo à literatura e à poesia também não é surpresa. Mas os regionalismos, igualmente caldeados num saber antigo, contribuem para tal enriquecimento.

Por exemplo, só para recorrer a palavras começadas por “des”: Desgargoleirado (por desgargolado, com decote ou colarinho largo), no Dicionário do Falar Algarvio, de Eduardo Brazão Gonçalves, 1996; Desencodear (tirar a côdea), no Dicionário de Palavras Soltas do Povo Transmontano, de Cidália Martins, José Pires e Mário Sacramento, 2017; Desbussolado (por desnorteado), no Dicionário de Língua Baianaêsa, de Luciano Jatobá, 2004; ou até, numa língua que é filha directa da língua portuguesa, Desmagâ (por esmagar, esmigalhar), no crioulo cabo-verdiano, segundo o Léxico do Dialecto Crioulo, de Armando Napoleão Fernandes, 1889-1969.

Mas deslavrar, deslaiar, desleigar, deslimar, desmaginar, desnevoar, desnocar, desnoutar, despoer, despolir, desrefolhar, desrisonhar, desvizinhar, quem as inventou? Os dicionários não dizem, mas estão todas lá. Algumas há anos, outras há décadas. E todas elas poderiam caber numa qualquer “língua desportuguesa”, porque esta, nascendo do barro da palavra e da fala, será portuguesíssima. Por curiosidade, diga-se que o volumoso dicionário da Sociedade de Língua Portuguesa dedica 154 páginas só às palavras começadas por “des” (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, de José Pedro Machado, 1981, Tomo IV, págs, 62 a 216) e lá, além das já citadas, estão centenas de palavras que nos parecerão… “desportuguesas”.

É claro que ficcionistas e poetas têm inventado palavras, que os dicionários acolhem ou não, como o inutensílio de Manoel de Barros (“O poema é antes de tudo um inutensílio”, Poesia Completa, 2010, pág. 182) ou as bem-pensânsias de Alexandre O’Neill (Poesias Completas, 2000, pág. 195). Mas é bom lembrar que, antes deles, muito antes deles, são sobretudo as crianças que mais palavras inventam sem as registarem, pelo simples gozo da descoberta, trocando-lhes letras e sentidos, virando palavras do avesso como quem revira brinquedos.

Ao conjunto de tudo isto, juntando as novidades que nos traz a liberdade estética às heranças ancestrais da etimologia, pode bem chamar-se língua portuguesa, com as suas variantes culturais, lexicais e até ortográficas, porque os “desportuguesamentos” que dela derivam a enriquecem. Ao contrário da propalada e nunca conseguida (porque impossível e inútil) unificação ortográfica, teimosamente imposta por um acordo que nunca o foi nem será.

Ondjaki: “Eu não opero com língua de dicionário, eu opero com língua de barro”

“Público” (Ípsilon),
Isa­bel Cou­ti­nho

Ondjaki regressa à infância e juventude da personagem Ndalu, dos seus tios, avós e amigos da Luanda dos anos 1980/90

 

Andou às voltas com um cubo mágico para chegar aqui, onde tudo se encaixa. No ano em que comemora 20 anos de vida literária, lançou O Livro do Deslembramento, auto-ficção onde regressa às personagens da sua até agora tetralogia dedicada à Luanda dos anos 80. Para o angolano, é o seu livro mais psicológico e aquele em que os escudos literários estão mais em baixo.

Ondjaki, de seu verdadeiro nome Ndalu de Almeida, regressa em O Livro do Deslembramento (ed. Caminho) à infância e juventude da personagem Ndalu, dos seus tios, avós e amigos da Luanda dos anos 1980/90. Essa Luanda em que “uma pessoa não sabe passar um dia só sem inventar uma estória” vista pelos olhos de uma criança. Obra de auto-ficção, livro “composto a partir de memórias que derreteram ao sol”, é seguramente uma das mais belas e conseguidas em língua “desportuguesa”. Dá a sensação de que todos estes anos Ondjaki andou às voltas com um cubo mágico para chegar aqui, onde tudo se encaixa.

O romance faz parte da sua, até agora, tetralogia inaugurada com o romance Bom Dia Camaradas, que será discutido com o escritor a 15 de Dezembro, às 22h em Lisboa (19h em Brasília), na primeira sessão do Encontro de Leituras que reunirá online, através da plataforma Zoom, leitores lusófonos. É uma parceria entre o PÚBLICO e o jornal brasileiro Folha de S. Paulo. Dessa tetralogia fazem também parte Os da Minha Rua, AvóDezanove e o Segredo do Soviético.

O Prémio José Saramago 2013, com a obra Os Transparentes, tem 43 anos, regressou há três à cidade onde nasceu e inaugurou em Luanda a editora Kacimbo e a livraria Kiela. Continua a trabalhar sobre a memória que ficcionaliza. Não se lembra do que aconteceu há dias, mas daqueles tempos lembra-se com “uma nitidez absurda”.

“Lembrar, todos nós crescemos aqui e ali, agora o que é que vamos contar… É preciso um bocadinho de discernimento também”, diz durante uma conversa telefónica quase à hora do recolher obrigatório em Luanda por causa da covid- 19.

Começou a escrever O Livro do Deslembramento quando estava a terminar Os Transparentes, que lançou em 2012. Foi necessário o regresso a Angola para o finalizar?

Necessário não. Já escrevi muito sobre Angola estando fora. Realmente foi uma coincidência. Quando comecei a pensar e a falar com o meu editor, Zeferino Coelho, sobre o que íamos fazer quando chegasse a data dos 20 anos de vida literária, e como ele gosta de perguntar muitas vezes se tenho livro novo, disse-lhe que tinha e brinquei: mas não é novo; é um livro inédito, mas não é novo.
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«O (des)investimento na Educação em Portugal» [Ricardo Ferraz, “Eco”, 11.12.20]

Embora o tema do artigo transcrito entre na categoria “Outros Detritos” e não expressamente na secção principal, a do “Acordo Ortográfico”, evidentemente ambos estão umbilicalmente interligados: não existe Educação em geral sem o AO90, o qual contamina em especial aquela recém-misteriosa área lúdica em que se entretêm a destruir metodicamente qualquer vestígio de ensino/aprendizagem alguns políticos avulsos e decerto meia-dúzia de atrasados “técnicos” e linguistas.

Ora, se quem fala de Educação fala de AO90 e, por conseguinte, por mais elaborado que seja o método de demolição em curso, fala também um pouco de caligrafia — a eterna forma de expressão manual (e com alma). E nem a sua extinção administrativa nos planos curriculares — mesmo que no artigo não haja uma única referência expressa a “antiguidades” como os cadernos de duas linhas e os alunos com a língua de fora, concentradíssimos, escrevendo à mão na sua bela Língua — impede que pelo menos se reflicta sobre as mil e uma formas de o “nosso” Ministério da Educação torrar dinheiro.

Daí a imagem que ilustra este “post”. Aniquilar a Caligrafia e tornar em simultâneo obrigatória a “Ginástica” (“Educação Física”, sinal dos tempos), foi e continua a ser mais uma irritante imbecilidade mas, ao que parece, destruir é que é “progresso”. Isto, claro, dizem os “técnicos especialistas” que julgam suficiente para alterar o significado das palavras mudar-lhes o significante. Não é gente de tino, ignore-se os ignorantes diplomados.

Fica portanto à laia de sugestão esta pasta de caligrafia com papeis, carimbos, lacre (?), tinta, canetas de aparo. Por uns somíticos 12 €, agora que apesar de tudo vem aí o Natal.

O (des)investimento na Educação em Portugal

Ricardo Ferraz“Eco”. 11 Dezembro 2020

 

É evidente que Portugal não tem apostado o suficiente num sector que é vital. E um país que não investe no seu futuro está condenado ao insucesso e à insignificância no panorama internacional.

Quando alguém me pergunta onde é que pode aplicar o seu dinheiro, costumo responder: “educação e formação”. Perante um mercado laboral global e feroz, trata-se da solução mais adequada para quem pretende vingar. Para os que já estão fora do mercado, tal significa ocupação e aquisição de novos conhecimentos; há sempre novos mundos para explorar.

Também esta deve ser uma das principais apostas do Estado. Embora a literatura sobre o tema seja vasta, há consenso acerca dos benefícios da despesa pública em educação. Conciliando fontes primárias e secundárias e estimando um modelo econométrico, pude confirmar recentemente a existência de uma relação positiva e estatisticamente significativa entre as despesas do Estado em educação e o PIB per capita português ao longo de um extenso horizonte temporal compreendido entre a segunda metade do século XIX e os dias de hoje (veja-se The Portuguese Military Expenditure from a Historical Perspective publicado na revista científica britânica Defence and Peace Economics). Mais uma evidência acerca da importância da Educação para a economia portuguesa.

De facto, só nos poderemos tornar mais produtivos e competitivos se tivermos trabalhadores mais qualificados. Só assim o nosso país se poderá desenvolver e modernizar. Mas será que Portugal tem apostado verdadeiramente na Educação ao longo dos últimos anos?

Como se observa na Figura 1, a despesa das administrações públicas portuguesas em educação em percentagem do PIB tem apresentado uma trajectória descendente desde o ano de 2011; altura em que a ‘troika’ aterrou em Portugal. A partir de 2016, já após o fim do programa de assistência, começámos mesmo a registar valores inferiores aos da média da União Europeia a 28 (UE-28).

Despesa pública em educação (% do PIB), Portugal versus UE-28, 2001-2018)

Fonte: INE, Eurostat e cálculos próprios.

As estatísticas oficiais demonstram ainda que se no início do presente século Portugal era o 3.º país da UE-28 com a mais elevada despesa pública em educação em percentagem do PIB, no ano de 2018 encontrava-se no modesto 20.º lugar. Caímos a pique no ranking.

Recordo que em 2017, o primeiro-ministro, António Costa, veio a terreiro afirmar que o investimento na Educação era “absolutamente essencial” e uma “prioridade central”. No ano seguinte, Portugal acabaria por registar o rácio despesa pública em educação/PIB mais reduzido desde que há registos oficiais. A realidade não casa com o discurso político. Onde está o Ministro da Educação? Onde está o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior? Afinal de contas, qual é o peso político destes dois ministros no Governo do Dr. Costa?

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